A DANÇA NO PROCESSO DE APRENDIZAGEM E A CONSEQUENTE CONSTRUÇÃO DE VALORES
Resumo: O presente artigo vem refletir a utilização e aproveitamento do projeto extracurricular de dança dentro de uma unidade escolar. A dança faz parte do dia a dia dos alunos, em várias instancia de suas vidas, desta forma trazer esta atividade prazerosa para o contexto escolar, vem a agregar valores comportamentais aos discentes, hora perdidos, ou tomados como desnecessários, frente à competitividade e/ou falta de tempo da vida contemporânea. Percebemos a necessidade de apoio das instituições primárias familiar e escolar. Visto que discentes nesta faixa etária, 16 aos 18 anos, permanecem a maior parte do tempo de suas vidas nestes ambientes, logo da necessidade do diálogo, compreensão, facilitando assim a inclusão.
Palavras chaves: dança, educação, aprendizagem, valores.
INTRODUÇÃO
O presente artigo apresenta a utilização da arte milenar dança, no processo de aprendizagem, como atividade extracurricular, no caso, relata uma experiência com projeto de dança em uma escola publica do estado de Santa Catarina.
Sabe-se que na atualidade, é bastante difícil, manter a atenção do aluno em sala de aula, nas matérias curriculares tradicionais, ou até mesmo, mantê-lo na escola, frente aos atrativos que existem fora dela.
A possibilidade de resgate dos discentes, frente às várias problemáticas que cercam suas vidas, pode ser encontrada em diversas fontes, sendo uma delas a atividade com dança.
DANÇA NO CONTEXTO E EM CONTEXTO
A dança faz parte da vida do ser humano desde os primeiros instantes de vida, quando no bailar dos braços, sente o ar pela primeira vez no corpo e entrando pelas narinas, um susto sim, mas isto é estar vivo.
Dançar, não é somente belos passos coreografados, ao som ou não de uma música, dançar é toda uma situação gestual, desde um caminhar, correr, sentir seu corpo, deslocamento, experimentação de movimentos, e de repente, acontece à dança. É uma arte, que tem como base o próprio corpo, como afirmam Vianna e Carvalho (1990, p. 56): “O corpo inteiro transmite um significado e pode contar uma história através de seus gestos como caminhar, ao sentar, ao ficar em pé, ao estar acordado ou adormecido”.
Existem evidências de que os povos primitivos já se utilizavam da dança como manifestação em rituais relacionados à caça, e até mesmo a morte, como podemos ver nos desenhos existentes nas paredes da caverna de Lascaux, na França. Na Grécia antiga, a dança estava ligada diretamente aos jogos e a exposição dos belos corpos.
Assim, seguindo a evolução humana, a dança também evoluiu, mudando seus objetivos, de acordo com os padrões sociais de cada século. O que não muda, é o desejo de se expressar do homem, e a utilização da dança para tal.
Ainda Vianna e Carvalho (1990, p. 58), nos coloca dentro desta perspectiva:
A vida, o mundo e o homem manifestam-se através do movimento. Dançar é mover-se com ritmo, melodia e harmonia. Por tal razão, nas metafísicas orientais, os deuses responsáveis pela criação do mundo são geralmente apresentados como os senhores da Dança. Este é, por exemplo, o caso de Shiva Nataraja, o Senhor da Dança, deus indiano da criação.
Sendo assim, a dança como fonte de expressão, por que não utilizá-la no contexto escolar? Bem, a dança está inserida no contexto escolar dentro da disciplina de artes. Aqui já poderíamos abrir várias discussões sobre o assunto, desde o descaso governamental e até dos próprios professores de artes sobre o assunto, até a má qualificação profissional dos docentes, e a falta de estrutura nas escolas para que se desenvolvam as atividades relacionadas à dança.
No entanto, não é sobre esta problemática, que o presente artigo vem desenvolver. O que queremos aqui é refletir sobre a utilização da dança no desenvolvimento cognitivo e social dos discentes. Nesta perspectiva, Pereira (2001, p.61) coloca que:
[...] a dança é um conteúdo fundamental a ser trabalhado na escola: com ela, podem-se levar os alunos a conhecerem a si próprios e/com os outros; a explorarem o mundo da emoção e da imaginação; a criarem; a explorarem novos sentidos, movimentos livres. Verifica-se assim, as infinitas possibilidades de trabalho do/para o aluno com sua corporeidade por meio dessa atividade.
A dança faz parte do dia a dia dos alunos, em várias instancia de suas vidas, desta forma trazer esta atividade prazerosa para o contexto escolar, vem a agregar valores comportamentais aos discentes, hora perdidos, ou tomados como desnecessários, frente à competitividade e/ou falta de tempo da vida contemporânea.
Valores como o da amizade, respeito com o diferente, com a capacidade intelectual ou motora dos colegas, disciplina em questão de horário, nas atividades, na entrega de trabalho, socialização e entendimento do ser como individuo social, a consciência e o respeito pelo corpo, são trabalhados e reforçados nas aulas de dança. Não como uma imposição, mas como conseqüência das atividades desenvolvidas.
Nas condições de verdadeira aprendizagem os educandos vão se transformando em reais sujeitos da construção e da reconstrução do saber ensinado, ao lado do educador, igualmente sujeito do processo. Só assim podemos falar realmente de saber ensinado, em que o objeto ensinado é apreendido na sua razão de ser e, portanto, aprendido pelos educandos. (FREIRE, 1996, p.26).
Respeitar o aluno na sua individualidade, propiciando a ele uma atividade que seja de seu grado, não com intensão de formar bailarinos, mas de forma a estimular, consciente ou não seu potencial humano pode e deve ser tarefa da escola.
EXPERIÊNCIAS COM DANÇA NA ESCOLA
Nos anos de 2009 e 2010, foi desenvolvido um projeto de dança na Escola de Educação Básica Miguel Couto, da cidade de Schroeder em Santa Catarina, com alunos de ensino médio. Os alunos foram convidados a participar de acordo com a disponibilidade e interesse. No inicio das atividades, nos dois anos, apresentou-se um fenômeno parecido, o numero elevado de inscritos, que por uma seleção natural, acabava se estabelecendo em número de aproximadamente vinte alunos.
As atividades aconteciam, no pavilhão da própria escola, num ambiente impróprio para a dança, mas que não apresentava perigo aos alunos. As atividades eram realizadas em três horas semanais, em dois dias da semana, tempo este dividido em três momentos base, o alongamento, a realização da atividade proposta para o dia, o relaxamento e discussão (se necessário) das atividades realizadas. A proposta inicial era a da socialização, a atividade física e apresentações em festivais, eventos na região e na própria escola. Porem com o passar do tempo, e o desenvolvimento técnico dos alunos, construímos coreografias beirando a expectativa de grupos com longa duração e estrada. Participamos de festivais, na cidade de Jaraguá do Sul, Schroeder, eventos na escola, envolvendo a comunidade e fomos convidados pela secretária de educação do município de Schroeder, a participar do auto de natal municipal onde aproximadamente obtivemos um publico de pessoas.
No decorrer do ano, alguns acontecimentos não passaram despercebidos. Como a dificuldade de alguns alunos em disciplinas exatas, beirando a reprovação e o interesse dos mesmos pelas aulas de dança. Outra observação feita foi o vinculo de amizade entre os alunos que perpassou o ambiente escolar. A aceitação dos colegas, a assiduidade dos discentes, a pontualidade, que antes não acontecia em sala em aula curricular. A não desistência da escola para não deixar o ambiente da dança, a integração de classes sócias e o respeito pela individualidade sexual. Situações estas, bastante complexas quando se trata de adolescentes estudantes do ensino médio, frente ao descortinar da vida.
A ÚLTIMA DANÇA
Muitas dificuldades são encontradas ao longo de um novo caminho, o caminhante deve estar atento aos atalhos e a melhor forma de passar pela estrada hora cheia de buracos.
O grupo de dança encontrou algumas dificuldades na jornada, que valem ser refletidas. Dentro do ambiente escolar, não houve aceitação por parte de alguns discentes, que davam pouca importância ao projeto, por vezes, querendo sua extinção, outras desestimulando com atitudes ou comentários não condizentes com educadores.
Entende-se que, por razões historicamente determinadas à educação escolar tem privilegiado valores intelectuais em relação a valores corporais, assim abordam essa idéia Carbonera e Carbonera (2011). Porém, compreendemos que deve haver um caminhar em conjunto, sempre respeitando a individualidade dos alunos e suas tendências. Segundo Giffoni (1973, apud CARBONERA; CARBONERA, 2011, p.), “os problemas educacionais quase sempre são considerados pelo lado intelectual, constituindo uma das faltas da educação”. Assim também concorda Bèrge (1988, apud CARBONERA; CARBONERA, 2011, p.), quando utiliza a metáfora “O cérebro se empanturra, enquanto o corpo permanece esfomeado”. Quando um grupo possui apoio, facilita deveras o enriquecimento do produto final. Encontramos o apoio na direção escolar, sempre auxiliando nos eventos, no transporte dos alunos, com participação efetiva na vida do grupo. A diretora da escola Márcia Kohts Hildebrandt, declara:
Como profissional de Educação Física, sempre apoiei trabalhos extraclasse e vejo a importância que trás na vida dos alunos, pois nessas atividades alguns alunos podem demonstrar o talento muitas vezes não encontrados em sala de aula. Na escola onde atuo, consegui perceber a diferença que existe no grupo de dança. Alunos que não tinham mais interesse em estudar, continuaram e conseguiram ser aprovados graças ao trabalho desenvolvido. Alunos que seriam percebidos, simplesmente esquecidos, tiveram seus dias de destaque em palcos e apresentações importantes em nossa cidade e região. Como educadora, através de muitos estudos que fizemos, aprendemos que temos que avaliar o aluno num todo e valorizar o que ele tem de melhor. Nesse grupo conseguimos (digo no plural porque sei que tive minha participação) valorizar alunos que nunca seriam "enxergados pela comunidade" não só como artistas, mas às vezes, vistos apenas como jovens problemáticos. Se conseguirmos mais atividade extracurriculares de diversas alternativas teríamos mais jovens e adolescentes fora de caminhos que não são bem vistos pela sociedade.
Tentem imaginar a dualidade, falta de apoio dos docentes e o preconceito em relação à dança de alguns pais. As duas instituições que acolhem o indivíduo e o preparam para uma sociedade, incutem neste ser conceitos duvidosos de moral. Apesar de serem casos isolados, vale o comentário da dificuldade de pais em compreenderem que seu filho, do “sexo masculino”, tenha desejo e paixão pelo ato de dançar. Sem que esta atividade demostre algum desvio sexual. Quando estas instituições primárias são preconceituosas, o que podemos esperar do individuo que dela se alimenta culturalmente.
Não vamos entrar aqui no mérito do que é correto ou não, mas fica como reflexão a despeito do estigma em relação à dança, é coisa de menina sim, e de menino também, decidimos então dançar contra o preconceito. Como conseqüência temos a aprovação dos alunos, vejamos o que L.M. nos diz:
A Dança me fez muito bem. Não havia intrigas entre os dançarinos! Tinha coisas, que uns auxiliavam aos outros. Sempre aperfeiçoando mais e mais! Pra participar não basta só achar legal. Também tem que se esforçar se dedicar, ser responsável. Dei o meu melhor! A dança me ensinou que não podemos ter medo de errar e sim ser persistente no nosso objetivo. Eu participava com muito ânimo, força de vontade. As aulas eram ótimas, bem criativas bem divertidas! Enfim, as aulas foram de bom proveito, foram momentos únicos que levarei para a vida toda. (L.M. 1 5 anos, aluna do 1º ano.)
Cada vez mais podemos observar a participação dos meninos na dança, podendo ser medida pelo contexto cultural em que a escola está inserida, por exemplo, em Joinville com o balé Bolshoi a uma grande aceitação do sexo masculino em relação à dança.
A escola em questão situa-se no norte de Santa Catarina, está em franco desenvolvimento econômico e expansão, é natural que o pensamento ainda esteja em transcendência. É desta forma que os meninos participantes do projetam pensam, aqui representados por E. D. declara:
Bem, as aulas de dança, foram apenas umas da muitas atividades extras a qual eu participei, assim no começo foi meio cansativo, tinha muita gente, muita vergonha das pessoas não tínhamos muita intimidade com todo mundo, pois não convivíamos todos os dias juntos, mais após um tempo os alunos diminuirão, os mais interessados continuaram e ai ficou melhor de nos entrosarmos.As aulas me fizeram super bem, me ajudaram a ter a postura ereta, me ajudaram a me enturmar mais, me ajudaram até na escola com as garotas eu digo...mais deixa esta parte pra lá! Meu eu era um garoto muito tímido apesar de não demonstrar isso nas aulas da escola, eu sei lá não sou muito de me enturmar com pessoas intelectuais [...] e apesar de eu gostar e muito de garotas eu gostava mais de ficar com o L., com o J. e o G., estudávamos juntos até eu passar para a noite. [...] foi o ano mais divertido da minha vidinha, o momento que passava com eles dançando, rindo, brincando os momentos sérios (poucos) mais sérios os momentos de tensão, adrenalina, cara foi tipo assim único. (E.D. 17 anos, estudante do 3º ano)
Não vamos nos apegar as dificuldades, mas sim, valorizar a experiência e os resultados alcançados, tornando o aluno um ser mais crítico e criativo, muito mais consciente, extrapolando os valores aprendidos na dança, para sua vida.
CONCLUSÃO
Podemos compreender a importância da dança na vida cognitiva e social do aluno, reconhecendo o valor da mediação do professor nas atividades que ultrapassam a vida escolar. Sendo conscientes, do quanto exercemos influencia no comportamento do aluno, assim sendo, a necessidade da ética profissional.
Percebemos a necessidade de apoio das instituições primárias familiar e escolar. Visto que discentes nesta faixa etária, 16 aos 18 anos, permanecem a maior parte do tempo de suas vidas nestes ambientes, logo da precisão do diálogo, compreensão, facilitando assim a inclusão.
Com clareza podemos concluir a estima da base às atividades extracurriculares, servindo de apoio as disciplinas de sala, como sufrágio ao interesse do aluno, a assiduidade, o comprometimento, entre outros fatores que podemos notar que elevaram o nível educacional dos alunos.
REFERÊNCIAS
CARBONERA, Daniele; CARBONERA, Sergio Antonio. A importância da dança no contexto escolar. 2008. Disponível em: <http://www.diaadiaeducacao.pr.gov.br/diaadia/diadia/arquivos/File/conteudo/artigos_teses/EDUCACAO_FISICA/monografia/DANCA_ESCOLA.pdf>. Acesso em: 14 jan. 2011
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996.
PEREIRA, S. R. C. Dança na escola: desenvolvendo a emoção e o pensamento. Revista Kinesis, Porto Alegre, n. 25, p.60- 61, 2001.
VIANNA, Klauss; CARVALHO, Marco Antonio de. A Dança. São Paulo: Siciliano, 1990.
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